A ética na pesquisa qualitativa é fundamental para proteger os participantes e garantir a integridade do estudo. Os pesquisadores devem adotar práticas como consentimento informado, confidencialidade e reflexividade, respeitando a autonomia dos participantes e minimizando riscos.


Introduction
A ética em pesquisa é um tema frequentemente discutido devido a que se constitui como um dos pilares fundamentais que sustentam a integridade da ciência. A pesquisa qualitativa se destaca por sua capacidade de explorar a profundidade das experiências humanas, mas essa profundidade traz consigo uma responsabilidade ética significativa. De acordo com um estudo da American Psychological Association (APA, 2017), a falta de práticas éticas em pesquisa pode levar a consequências adversas, não apenas para os participantes, mas também para a credibilidade da pesquisa em si. Portanto, é imperativo que os pesquisadores adotem criterios éticos em todas as etapas de suas investigações.
Neste artigo, iremos abordar os princípios éticos e quais estratégias práticas podem ser implementadas para garantir a proteção dos participantes e a integridade do estudo.
Conceitos e Definições de Ética em Pesquisa Qualitativa
Ética em Pesquisa Qualitativa
A ética em pesquisa qualitativa refere-se ao conjunto de princípios que orientam a condução de estudos, assegurando a proteção dos participantes e a integridade do processo de pesquisa. Isso inclui a consideração de questões como consentimento informado, confidencialidade e reflexividade (Liamputtong, 2007).
Consentimento Informado
O consentimento informado é um processo pelo qual os participantes são informados sobre os objetivos, métodos, riscos e benefícios da pesquisa, permitindo que tomem decisões conscientes sobre sua participação. Este processo deve ser visto como um diálogo contínuo entre o pesquisador e o participante. A clareza e a transparência são essenciais para garantir que os participantes compreendam plenamente o que está em jogo (Beauchamp & Childress, 2013). Por exemplo, ao conduzir uma pesquisa sobre saúde mental, os pesquisadores devem explicar claramente os riscos potenciais de discutir experiências pessoais.
A sua vez, é fundamental conhecer os aspectos que adopta o consentimento informado em menores de idade, sejam crianças e/ou adolescentes. Particularmente, a autorização depende do representante legal do participante, a pesar disso, o menor pode decidir participar ou não, no caso de ter previamente o consentimento do adulto. Por outro lado, o pesquisador deve se atualizar com as normativas do seu país, já que por exemplo, em alguns países o adolescente a partir de 16 anos pode dar seu consentimento, embora em outro país, seja a partir dos 18 anos.
Reflexividade
THE reflexivity é a autoanálise crítica do pesquisador sobre seu papel e o impacto no processo de pesquisa. Isso envolve a conscientização de como as próprias crenças, valores e experiências do pesquisador podem influenciar a coleta e a interpretação dos dados (Finlay, 2002). A reflexividade enriquece a análise e ajuda a mitigar preconceitos que podem afetar a pesquisa. Por exemplo, manter um diário de pesquisa onde os pesquisadores registram suas reflexões pode ser uma prática valiosa.
Princípios Éticos Fundamentais
1. Respeito pela Autonomia
Os pesquisadores devem respeitar a autonomia dos participantes, garantindo que eles tenham o direito de decidir se desejam ou não participar da pesquisa. Isso implica em fornecer informações claras e acessíveis sobre o estudo (Beauchamp & Childress, 2013).
2. Beneficência e Não Maleficência
Os pesquisadores têm a obrigação de maximizar os benefícios e minimizar os danos potenciais aos participantes. Isso requer uma avaliação cuidadosa dos riscos associados à pesquisa e a implementação de medidas para mitigá-los (Liamputtong, 2007). A avaliação de riscos deve ser um processo contínuo, adaptando-se conforme novas informações surgem durante a pesquisa.
3. Justiça
A justiça na pesquisa implica em garantir que os benefícios e os ônus da pesquisa sejam distribuídos de maneira equitativa entre todos os grupos sociais. Isso significa evitar a exploração de populações vulneráveis e assegurar que todos os grupos tenham acesso igualitário aos benefícios da pesquisa (Vidal, 2022).
Garantindo a Confidencialidade dos Participantes
A confidencialidade é um aspecto crucial da ética em pesquisa qualitativa. Os pesquisadores devem implementar estratégias para proteger a identidade e os dados dos participantes. Algumas práticas recomendadas incluem:
- Codificação de Dados ou pseudónimos: Atribuir códigos aos dados coletados, em vez de usar nomes ou identificadores pessoais, para proteger a identidade dos participantes ou também usar nomes ficticios (Liamputtong, 2007).
- Armazenamento Seguro: Utilizar métodos seguros para armazenar dados, como criptografia e acesso restrito, para evitar vazamentos de informações (Grande Ratti et al., 2024).
- Consentimento para Divulgação: Obter o consentimento dos participantes antes de compartilhar qualquer informação que possa identificá-los, mesmo em publicações ou apresentações (Beauchamp & Childress, 2013).
Reflexividade na Pesquisa Qualitativa
A reflexividade é uma prática essencial que permite aos pesquisadores reconhecerem e refletirem sobre suas próprias influências no processo de pesquisa. Isso pode incluir:
- Diários de Pesquisa: Manter um diário de pesquisa onde os pesquisadores registram suas reflexões sobre o processo, suas interações com os participantes e suas próprias reações emocionais (Finlay, 2002).
- Discussões em Grupo: Participar de grupos de discussão com outros pesquisadores para compartilhar experiências e reflexões sobre questões éticas e metodológicas.
- Supervisão e Mentoria: Buscar orientação de colegas mais experientes para discutir dilemas éticos e receber feedback sobre a abordagem da pesquisa (Liamputtong, 2007).
Implicações da Falta de Ética em Pesquisa Qualitativa
A falta de ética na pesquisa qualitativa pode ter consequências graves, tanto para os participantes quanto para a comunidade científica. Algumas das implicações incluem:
- Danos aos Participantes: A pesquisa não ética pode causar danos físicos, emocionais ou psicológicos aos participantes, comprometendo sua segurança e bem-estar (Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo [FCFRP-USP], 2020).
- Desconfiança na Pesquisa: Escândalos de pesquisa podem levar a uma desconfiança generalizada na comunidade científica, dificultando a aceitação de novos estudos e descobertas (Pinto, 2015).
- Consequências Legais: Pesquisadores que não seguem diretrizes éticas podem enfrentar ações legais, incluindo processos judiciais e sanções profissionais.
Dúvidas e Erros Frequentes sobre ética em pesquisa qualitativa
Confusão entre Ética e Conformidade
Um erro comum entre pesquisadores é confundir ética com conformidade. Muitos acreditam que a aprovação de um comitê de ética é suficiente para garantir a ética da pesquisa. No entanto, a ética deve ser vista como um processo contínuo que envolve reflexão e adaptação ao longo de todo o estudo (Beauchamp & Childress, 2013).
Subestimar a Importância do Consentimento Informado
Outro erro frequente é não fornecer informações suficientes aos participantes durante o processo de consentimento informado. Isso pode comprometer a validade do consentimento e a integridade da pesquisa. Os pesquisadores devem garantir que os participantes compreendam completamente o que está em jogo antes de concordar em participar (Padilha et al., 2005).
Implicações Futuras da ética em pesquisa e uso de tecnologias
À medida que a pesquisa qualitativa continua a evoluir, as diretrizes éticas também devem se adaptar. A integração de tecnologias emergentes, como inteligência artificial e análise de big data, traz novos desafios éticos que exigem uma abordagem proativa. Os pesquisadores devem estar preparados para considerar questões como privacidade de dados, consentimento em ambientes digitais e a responsabilidade social de suas pesquisas (Organización de las Naciones Unidas para la Educación, la Ciencia y la Cultura [UNESCO], 2021 ).
Dicas sobre boas práticas em pesquisa
- Busque Orientação: Sempre procure a orientação de colegas experientes ao enfrentar dilemas éticos. A troca de experiências pode oferecer novas perspectivas e soluções (Finlay, 2002).
- Mantenha Comunicação Aberta: Estabeleça uma comunicação clara e contínua com os participantes sobre o uso de seus dados e o direito de se retirar da pesquisa a qualquer momento. Além disso, a respeito das ferramentas de coleta de dados, como gravações de voz, notas por escrito e/ou vídeos, é importante combinar tais procedimentos com os participantes (Grande Ratti et al., 2024).
- Revise Regularmente as Diretrizes Éticas: Esteja sempre atualizado sobre as diretrizes éticas e as melhores práticas em sua área de pesquisa (FCFRP-USP, 2020).
Conclusion
A pesquisa qualitativa ética e responsável é essencial para garantir a proteção dos participantes e a credibilidade dos resultados. Os pesquisadores devem adotar uma abordagem reflexiva e proativa em relação às questões éticas, assegurando que suas práticas não apenas cumpram os requisitos legais, mas também promovam o bem-estar e a dignidade dos indivíduos envolvidos. Ao seguir as boas práticas discutidas neste artigo, os pesquisadores podem contribuir para um campo de estudo mais ético e comprometido com as diversas problemáticas de pesquisa.
Chamada para Ação
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Glossário de Termos
- Reflexividade: A prática de autoanálise crítica do pesquisador sobre seu papel e impacto no processo de pesquisa.
- Beneficência: O princípio ético que implica em maximizar os benefícios e minimizar os danos aos participantes.
References
American Psychological Association. (2017). Ethical Principles of Psychologists and Code of Conduct. https://www.apa.org/ethics/code/
Beauchamp, T. L., & Childress, J. F. (2013). Principles of Biomedical Ethics. Oxford University Press.
Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (2020). Diretrizes para promoção de Boas Práticas Científicas. Ética e Integridade nas Atividades Científicas. https://fcfrp.usp.br/wp-content/uploads/sites/528/2020/12/Boas-Pr%C3%A1ticas-Cient%C3%ADficas-da-FCFRP.pdf
Finlay, L. (2002). “Outing” the researcher: The provenance, process and practice of reflexivity. Qualitative Health Research, 12(4), 531–545. https://doi.org/10.1177/104973202129120052
Grande Ratti, M. F., Murature, D., Sánchez del Roscio, A., Frei, S., & Benítez, S. E. (2024). Ética en investigación cualitativa. Rev. Hosp. Ital. B.Aires. 44(1):e0000295. https://ojs.hospitalitaliano.org.ar/index.php/revistahi/article/view/295/266
Liamputtong, P. (2007). Researching the Vulnerable: A Guide to Sensitive Research Methods. SAGE Publications. https://doi.org/10.4135/9781849209861
Padilha, M. I. C. S., Ramos, F. R. S., Borenstein, M. S., & Martins, C. R. (2005). A Responsabilidade do pesquisador ou sobre o que dizemos acerca da ética em pesquisa. Texto Contexto Enferm. 14(1):96-105. https://www.scielo.br/j/tce/a/JmGdS5LFhF5DzSLSWgZpRGL/?lang=pt#
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